sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Sociedade, mídia e futebol

Uma questão fundamental nas negociações dos direitos de transmissão do futebol têm sido neglicenciada: as relações entre a sociedade e o futebol. Tanto a Rede Globo como a Record enxergam no futebol apenas uma fonte a mais de lucro. Nisso embarcam a quase totalidade dos jornalistas, torcedores e dirigentes de clube,  preocupados mais em engordar suas contas bancárias do que propriamente com o futebol.

O futebol brasileiro é estruturador de imagens e representações sociais, estereótipos e contra-estereótipos, tanto positivos quanto negativos; é suficientemente rico e deveria ser capaz de despertar um interesse maior por parte do estado e dos movimentos sociais. Interesse que deveria se refletir em ações concretas não apenas no plano econômico como também no simbólico.

Se, do ponto de vista da sociedade, não há dúvidas que o futebol segue sendo central no imaginário nacional, o mesmo não se pode dizer do ponto de vista do estado. O que vemos é uma total complacência com a apropriação privada de algo que perpassa outros âmbitos da vida social, inclusive a esfera pública (1). Não  desconhecendo o possível caráter privado e outras particularidades econômicas das agremiações esportivas, que devemos, é claro, reconhecer. Mas, é preciso ampliar o leque de análise para a compreensão do que está em jogo nesse momento, em que se negociam os direitos de transmissão da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol a partir de 2012. É preciso que se incluam outras questões nestas negociações. Porque negociam-se direitos econômicos sim, ok, concordamos. Mas, também representações sociais, símbolos, identidades coletivas e história.

Por isso, seriam benvindas, a meu ver, medidas como uma oferta estatal na briga pela compra dos direitos de transmissão do futebol. Porque só a Globo e a Record se arriscam a negociar? Onde está a TV Pública nesse momento? Onde estão os defensores de liberdade de imprensa? Qual o papel da EBC e da TV Brasil no esporte nacional?

Semelhantemente ao já feito na Argentina, deveríamos incentivar o estado a investir o dinheiro do cidadão naquilo que é importante para ele. Isso afetaria diretamente a compra e venda do direito de transmissão das imagens, sem dúvida. Mas também, e mais importante, começaria a tocar em outras questões negligenciadas como: a corrupção nos meios esportivos; as associações entre dirigentes e empresários com máfias internacionais e com o narcotráfico; o tráfico de armas e a lavagem de dinheiro feitas através do futebol (2).

Portanto, defendo que deveríamos reivindicar do governo brasileiro que tenha uma postura mais ativa e propositiva, e faça uma oferta para compra e transmissão das partidas da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol. Quem sabe começe, assim, a peitar os grandes grupos empresariais como fez o governo argentino com o Clarín.

1 - Não se deve confundir o público com o estatal: apenas defendo que o governo brasileiro, como mantenedor de uma TV Pública,  deveria  ser alvo de reinvindicações sociais que dizem respeito à esfera pública.

2 - Após escrever esse texto, publicado no Blog do Nassif,  tomei conhecimento desta notícia relacionada.
...

5 comentários:

Anônimo disse...

Na verdade, é lamentável a atuação do governo argentino no futebol de lá. O futebol, por mais que seja parte do imaginário coletivo e da identidade brasileira (o que também é discutível) acontece em eventos privados e protagonizado por atores privados. O Estado não tem nada a ver com isso.
Se há máfia, narcotráfico, lavagem de dinheiro no meio, é questão para a polícia resolver. Se a TV se apropria do futebol, é porque os clubes não se organizam direito.
Francisco.

Anônimo disse...

Na Argentina, a atuação (segurando-me para não escrever intervenção) do governo no futebol está criando relações de dependência entre clubes e torcedores com o Estado quase tão promíscuas quanto aquelas citadas no post.
Francisco.

Doutor Sujeira disse...

Caro Francisco, em primeiro lugar obrigado pelo seu comentário. Aqui as opiniões divergentes sempre são benvindas. Apenas uma correção ao seu comentário: Na Argentina os próprios clubes pediram que o governo comprasse a transmissão, pois estavam falidos. Portanto, não houve intervenção estatal no sentido autoritário. Aliás, ultimamente o estado só é lembrado em caso de falência. Pergunte ao governo dos países ricos. Um abraço.

Anônimo disse...

Não houve, o governo pagou pelos direitos de transmissão. Por isso não escrevi intervenção, que é uma palavra forte.
O problema é a relação que está sendo criada entre clubes e governo, aumentando aquela confusão que já existia com os sindicatos e o barrabravas.
Abraços.
Francisco.
(tentei comentar também no artigo do advivo, mas não consegui. tudo bem, pelo menos você leu aqui)

Anônimo disse...

eu acho que a sociedade brasileira só se democratizará quando o futebol mudar (e não contrário, como em geral se supõe). O futebol é a atividade humana mais importante no brasil, depois do trabalho. e e dirigido por gente (eu falei gente, mas não sei se a palavra é suficientemente boa) como o velho, o genro do velho, a filha do genro, eurico vascaíno, e por aí vai. apesar das CPIs da bola, a bola continua rolando solta nos submundos do futebol, assunto que os que gostam de política consideram, erronemante, menor. Basta ver o número de comentários nos blogs de futebol com aqueles que tratam de "assuntos mais sérios" como a política e as questões sociais (como se o futebol não fosse...)acho uma boa ter política pública para futebol e determinar horários, preços, transportes e segurança pública condizentes com a importância do futebol na vida dos brasileiros. Mas os ministros dos esportes, pelo amor de deus!, eles têm medo das estações de TV.