terça-feira, 22 de março de 2011

Como anda a cultura em BH?

           Após resoluções e posicionamentos advindos da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte que transpareceram o direcionamento real das políticas culturais na capital, sentimos a necessidade de promover e participar das reações contra essa política. A maior parte do financiamento da cultura em todo o Brasil não é um financiamento público e sim através de um sistema de dedução fiscal (integral) transferindo o dinheiro e a responsabilidade pública para as empresas, seguindo a lógica dos interesses privados.
            Esse sistema faz parte de um processo de privatização da cultura que tem sua origem no governo Sarney com a Lei Sarney, instaurando o modelo de incentivo fiscal na política cultural. No governo Collor houve a criação da Lei Rouanet – vigente até os dias atuais – no qual os profissionais da cultura procuram recursos em instituições e empresas privadas, que ao apoiar determinado projeto cultural ou artístico tem parte de sua carga tributário abatida, ou seja, uma relação privada com dinheiro público. Já no governo FHC, foi introduzida a partir da Medida Provisória 1.589 a dedução de 100% para projetos de "artes cênicas; livros de valor artístico, literário ou humanístico; música erudita ou instrumental; circulação de exposições de artes plásticas; doações de acervos para bibliotecas públicas e para museus", até torná-la a Lei 9.874, em 23 de novembro de 1999.
            Segundo Yacoff Sarkovas, “o incentivo fiscal é uma estratégia de aplicação do dinheiro público objetivando estimular o investimento privado.” Ele cita o exemplo da Lei do Audiovisual, no qual a dedução fiscal das empresas é de 124%, o que gera um “mero repasse de dinheiro público para aplicação privada”, que nesse caso, não é uma dedução integral, e sim sobreintegral. “Essas empresas não colocam dinheiro próprio para esse filme. Mais do que isso, elas recebem dinheiro público.”
            Esse tipo de financiamento da cultura, mesmo sendo realidade no Brasil há algum tempo, não é a única maneira possível. “O apego às leis de incentivo tem raízes no descaso histórico do Estado brasileiro pela cultura”. Sarkovas apresenta o exemplo de países em que “o benefício se restringe a permitir o abatimento de patrocínios e doações na renda bruta dos contribuintes, e não na sua dedução no imposto a pagar”. Ou no caso da França que é utilizado um sistema de mérito.
            O modelo de privatização da cultura adotado no Brasil está refletido nas políticas adotadas pela FMC – Fundação Municipal de Cultura - da capital mineira - presidido por Thaís Pimentel - principalmente durante a prefeitura de Márcio Lacerda (PSB). Desde então houve a suspensão do projeto Arena da Cultura, criado em 1998, com o intuito de difundir a cultura e “estimular e ampliar a participação efetiva da sociedade civil na formulação, discussão e decisão da política cultural” em bairros periféricos, com a criação de oficinas, seminários, ciclo de debates, curso de formação de agentes e produtores culturais e etc.
            Sintomático também foi o fechamento do Teatro Francisco Nunes e o edital de ocupação do Teatro Marília de 2011, no qual, “pela primeira vez, a administração municipal pretende cobrar uma diária mínima pela ocupação do espaço. O Marília é o único teatro municipal em funcionamento em BH”. As polêmicas em torno da décima edição do Festival Internacional de Teatro de BH em 2010 também se enquadram nas lamentáveis deliberações da FMC.
            Menos divulgado é o tipo de política que está sendo empregada no Museu de Arte da Pampulha. Além do grande corte de funcionários, a prefeitura destituiu os cargos de diretor e curador do Museu, delegando a direção das unidades da cultura dependentes do município à FMC. Os cargos destituídos eram compostos por especialistas e profissionais ligados às artes contemporâneos. Atualmente essas unidades - como o MAP – se tornaram altamente dependentes da FMC, diminuindo assim a autonomia dessas instituições. O que até então era função de um profissional das artes visuais passa a ser delegada à Fundação. Desmantelando assim todas as conquistas que davam autonomia a essas instituições para criação de uma política própria, constituição de acervo, propostas de exposições, residências para formação de jovens artistas, além de uma política educacional.
            Todas essas medidas praticadas pela prefeitura e pela FMC fazem com que a área de cultura e arte retroceda a um estado em que as instituições públicas que deveriam arcar com a produção de eventos de qualidade a serviço da população fiquem deficientes, e que o financiamento à cultura continue a cargo do serviço privado, aprofundando o processo de privatização da cultura e das artes.

             O resultado da política vigente é caracterizado pela privatização e sucateamento dos recursos e meios de produção de arte que vêm subjugando os processos de criação artística a uma lógica a serviço do marketing das empresas ao mesmo tempo em que estrangulam a pesquisa artística e a criação livre. Dessa forma, convocamos os estudantes em geral - parcela significativa do público crítico e apreciador de arte na cidade - e especificamente os estudantes das artes e o professorado (que se encontram ou se encontrarão em atividades profissionais que dependem de políticas públicas eficientes para seu desenvolvimento); convocamos também a comunidade da UFMG, da Escola de Música da UEMG, da Escola Guignard, bem como a classe artística em geral para comparecer a audiência pública do dia 23 de março de 2010, às 13:30, na Câmara Municipal (Av. dos Andradas, 3.100) convocada pelo Movimento Nova Cena para se opor às políticas culturais de BH e discutir outras vias para o financiamento a cultura e para a mobilização dos artistas. Estarão presentes na mesa um representante do prefeito Márcio Lacerda, a presidente da FMC, Thaís Pimentel, o vereador Arnaldo Godoy e um representante do Movimento Nova Cena.

(Texto publicado pelo D.A. da Belas-Artes e Música da UFMG).



Os tópicos da audiência são:

 - diretrizes da atual administração para a Cultura da capital mineira;
 - relevância da economia da cultura e das políticas culturais na gestão da prefeitura municipal;
 - baixa execução orçamentária da Fundação Municipal de Cultura;
 - orçamento e revisão da Lei Municipal de Incentivo à Cultura
 - implementação do Conselho Municipal de Políticas Culturais e do Plano Municipal de Cultura;
 - subutilização dos equipamentos culturais: Teatro Francisco Nunes fechado, cobrança de taxa de locação do Teatro Marília, dentre outros;
 - programas suspensos e ameaçados: FIT-BH, Arena da Cultura, Mostra de Artes Cênicas para Crianças, Arte Expandida, BH Cidadania, dentre outros.

Todos à Audiência Pública: A prefeitura de BH e o sucateamento da cultura e das artes.


dia 23 de março, quarta feira
as 13:30
na Câmara Municipal (Av. dos Andradas, 3.100)

Para saber mais:



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